Por que precisamos de Unidades de Conservação?

Publicado por parquedasaves em 28/06/2019

Atualizado em 21 de novembro de 2024

Tempo de leitura: 9 minutos

Nos últimos meses, temos visto muitas notícias sobre Unidades de Conservação (UC) na mídia, mas muitas pessoas ainda têm dúvidas sobre o que é uma UC e qual é a sua importância. Por isso, decidimos falar um pouquinho sobre qual é o papel destas áreas protegidas.

As Unidades de Conservação são áreas que precisam de proteção por possuírem características ecológicas especiais para diferentes populações e ecossistemas do território nacional. O nome “Unidade de Conservação” foi dado pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), em conformidade com a lei nº 9.985, que é de 18 de julho de 2000.

É comum ouvirmos que o Brasil tem muitas áreas protegidas, e isso realmente é verdade quando falamos em números absolutos: o Brasil tem a maior quantidade de UCs e terras indígenas em relação ao restante do planeta. Isso faz perfeito sentido, já que temos a responsabilidade de proteger a maior biodiversidade do mundo – estima-se que existam 1,8 milhões de espécies de seres vivos no Brasil.

Onça-pintada, animal brasileiro cuja presença indica que uma floresta está saudável. Foto/Reprodução: iNaturalist/Greg Lasley

Mas, se pensarmos qual é a proporção do nosso território que tem áreas protegidas, não estamos em primeiro lugar. Há em torno de 30% de áreas protegidas em nosso território.

Muitos países possuem uma proporção semelhante à países vizinhos, como: a Colômbia (30%), a Bolívia e a Venezuela (mais de 40%); e até países desenvolvidos, como a Bulgária (34%), a Grécia (35%) e a Alemanha (38%). Ou seja: temos muitas áreas protegidas, mas elas não abrangem uma grande proporção do nosso território.

Além disso, nossas áreas protegidas estão extremamente concentradas no bioma Amazônia, e sobra menos de 5% de áreas protegidas para os demais biomas (Caatinga, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e Pampas). Por isso, precisamos ampliar as áreas protegidas em outros biomas que precisam de atenção urgente, especialmente a Caatinga, que é exclusiva do Brasil.

Caatinga, o único bioma exclusivamente brasileiro. Foto/Reprodução: iNaturalist/m_santos

Mesmo considerando a Amazônia, o Brasil não é o país com mais florestas no mundo. Esse posto pertence à Rússia. Porém, somos o primeiro país em tamanho de florestas tropicais. Temos em torno de 67% de área de florestas e vegetação nativa em nosso território – porém, muitos outros países tem mais, como o Suriname (98%), a Guiana (84%), a Finlândia (73%), a Suécia (69%) e o Japão (68%).

Pelo menos 20 países do mundo tem mais florestas que o Brasil. É importante notar esses números se referem a florestas, e não se restringem a áreas protegidas, que são definidas legalmente. Ou seja: ainda temos muita área de floresta desprotegida no Brasil. Além disso, quando consideramos os números anuais de retirada de árvores , o Brasil é o país que mais desmata.

Troncos de árvores cortados empilhados em um ambiente ao ar livre, com céu nublado ao fundo, representando o impacto da exploração madeireira.

Quando pensamos em quantidade de madeira retirada das florestas anualmente, nosso país é o que mais desmata no mundo. Foto/Reprodução: Pixabay

É por razões como essas que sempre é importante relembrar que os ecossistemas que nossas unidades de conservação abrigam são moradas para a maior biodiversidade do mundo, desde bactérias até onças-pintadas.

Sem essas áreas protegidas, terrestres e aquáticas, a própria vida acaba não tendo condições mínimas para continuar existindo. Além das unidades de conservação serem literalmente a “casa” das milhões de espécies brasileiras, o que traz uma grande responsabilidade de cuidar dessas áreas, a Constituição do país também assegura que todo brasileiro tem “direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Dessa forma, entende-se que é dever de todos, cidadãos, organizações e esferas governamentais, zelar pelo cuidado e proteção da natureza. Uma das formas mais eficazes de cumprir essa missão é justamente por meio da criação e manutenção das Unidades de Conservação.

As unidades de conservação federais são administradas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Já para as estaduais e municipais, a administração fica a cargo dos Sistemas Estaduais e Municipais de Unidades de Conservação.

Existem dois tipos de unidades de conservação:

As unidades que são de Proteção Integral, que tem como foco a preservação dos ambientes naturais, possibilitando apenas o uso indireto dos seus recursos, sendo proibida a coleta, o consumo ou danos ao meio ambiente.

Um bom exemplo dessa categoria é o Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, vizinho ao Parque das Aves, que permite turismo e esportes de aventura, mas não permite retirada de madeira, por exemplo. São UCs de Proteção Integral: Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural, Refúgio de Vida Silvestre.

Vista panorâmica das Cataratas do Iguaçu em um dia subterrâneo, com água caindo em grande volume e vegetação ao redor, mostrando a grandiosidade da natureza.

Parque Nacional do Iguaçu, casa das Cataratas do Iguaçu, que abriga o maior remanescente de Mata Atlântica de interior do sul do Brasil. Foto/Reprodução: Pixabay/Werner Sidler

Já as unidades de Uso Sustentável, por sua vez, têm como função unir a conservação e uso sustentável dos recursos, conciliando a presença humana nas áreas protegidas. Nesse grupo, é permitido coletar recursos naturais, desde que essas atividades sejam realizadas de forma sustentável, respeitando os ciclos naturais dos seres vivos.

São UCs de Uso Sustentável: APA – Área de Proteção Ambiental; ARIE – Área de Relevante Interesse Ecológico; FLONA – Floresta Nacional; RESEX – Reserva Extrativista; REFAU – Reserva de Fauna; (vi) RDS – Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural.

Cacho de frutos de açaí pendente de uma palmeira, cercado por folhas verdes exuberantes sob a luz do sol.

Açaí amazônico produzido na Reserva Extrativista Mapuá, unidade de conservação de Uso Sustentável no Pará. Foto/Reprodução: iNaturalist/olivier_tostain

As UCs são criadas pelos Poderes Executivo e Legislativo e, para criar uma UC, é preciso respeitar algumas etapas básicas. Primeiro, são feitos estudos técnicos para determinar quais serão os limites e qual será a categoria da UC que está sendo proposta.

Para isso, são realizados levantamentos de espécies e também relatórios socioeconômicos, culturais e fundiários. Por exemplo: se a área a ser criada é marinha, pode-se fazer um diagnóstico de pesca. Esses estudos são mais ou menos profundos, dependendo da categoria da Unidade de Conservação.

Os estudos podem ser feitos tanto pelos órgãos governamentais, com seu próprio corpo técnico, quanto por consultorias contratadas. Nesses estudos, também verifica-se a existência de comunidades dentro da área da UC proposta, e caso sejam comunidades tradicionais, quais seriam os impactos envolvidos com o uso da área.

Depois, é elaborada uma proposta preliminar de categoria e limites da UC. Então, a proposta é apresentada junto à sociedade para ser discutida pelos setores interessados da sociedade, o que chamamos de Etapa Consultiva.

Qualquer cidadão pode participar. Após, a equipe técnica do ICMBio analisa as informações, em especial as que surgirem após a consulta, e elabora a proposta final, que vai para o Ministério do Meio Ambiente – MMA para ser analisada do ponto de vista técnico e jurídico. Por fim, no caso das Unidades de Conservação federais, o Presidente da República assina a criação das novas áreas protegidas.

Muita gente acredita que as áreas protegidas são improdutivas, mas isso não é verdade: algumas categorias de áreas protegidas, como as florestas nacionais e as reservas extrativistas podem produzir madeira, andiroba, borracha, castanha do Pará, óleo de copaíba e açaí, e nas terras indígenas há produção de mel e sementes. Esses produtos da floresta representam, em valor monetário, mais de 1,5 bilhão por ano! 

Semente de castanha-do-pará aberta, revelando várias castanhas marrons encaixadas em seu interior.

Castanha do Pará: produto da floresta que movimenta a economia brasileira. Foto/Reprodução: iNaturalist/Tony Rebelo

Além disso, estas áreas preservadas também prestam diversos serviços ambientais a nós – e o valor deles ninguém percebe, pois ninguém paga por esses serviços ecossistêmicos. Um estudo da revista Nature aponta que os serviços ambientais que as florestas oferecem para os seres humanos, como a produção de água, a purificação do ar, a manutenção do clima, a prevenção de inundações, a regulação de doenças, a geração de eletricidade, o auxílio à produção agropecuária (chuva, formação do solo, polinização, etc) custariam, todos os anos, 700 dólares por hectare de terra do planeta, se tivéssemos que pagar por eles.

No Brasil, esse valor representaria um custo de meio trilhão de reais, ou seja, mais de 129 bilhões de dólares! Se considerarmos que as exportações do agronegócio brasileiro representam 100 bilhões de dólares por ano, e que economizamos o equivalente a 129 bilhões de dólares anualmente (na cotação atual do dólar) preservando as florestas e outros biomas nativos, o valor dos serviços ecossistêmicos das florestas, quando convertido em dinheiro, é equivalente ao valor do agronegócio – inclusive, é um pouco superior.

Painéis solares em um campo verde sob um céu parcialmente nublado, representando uma fonte de energia limpa e sustentável.

Energia solar é um serviços ecossistêmicos oferecidos pela natureza. Foto/Reprodução: Pixabay/Sebastian Ganso

Por abrigar a maior biodiversidade do mundo, o Brasil tem uma responsabilidade imensa. Como país signatário da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), o Brasil assumiu o compromisso de manter em Unidades de Conservação 30% do bioma Amazônia e 10% dos demais biomas (Pampa, Pantanal, Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica e os ecossistemas Marinhos e Costeiros).

Nessa conta entram UCs estaduais, municipais e particulares. Essa também é uma das metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU, dentro do ODS 15: “proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade”.

O apoio do setor agropecuário é fundamental para cumprir essa missão, em especial porque 33% das nossas áreas de florestas e vegetação nativas são áreas privadas – as demais áreas de florestas são 35% áreas protegidas (UCs e terras indígenas) e 32% outras áreas públicas.

Porém, em áreas privadas, o desmatamento é maior: de 1985 a 2017, essas áreas particulares perderam 20% da sua dimensão, enquanto o desmatamento em áreas protegidas foi de apenas 0,5%. Ou seja: boa parte da nossa floresta está em terreno privado, mas ela também é mais desmatada nestas áreas particulares.

Uma opção que pode ajudar a solucionar essa questão e que mostra o quanto a conservação e a produção agropecuária podem andar de mãos dadas é uma categoria de unidades de conservação chamada Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs): terras particulares dentro das quais os próprios donos optam por criar áreas para a conservação de flora e fauna, sem que ocorra a desapropriação do local.

Aqui no Parque das Aves, desde 2017 decidimos focar nossos esforços no bioma Mata Atlântica, e por isso reconhecemos a importância e apoiamos a criação e manutenção de RPPNs, como a RPPN do Papagaio Charão . Além disso, animais que  temos aqui, como o mutum-de-alagoas (Pauxi mitu) extinto na natureza desde os anos 70 e que será reintroduzido em uma área de 9 mil hectares de Mata Atlântica conservada, resultado da união de 49 RPPNs pertencentes às usinas de cana de açúcar do Alagoas.

Mutum-de-Alagoas, ave extinta na natureza há mais de 40 anos pelo desmatamento. Será reintroduzida em áreas de Mata Atlântica criadas pelas mesmas empresas que causaram a sua extinção na década de 70. Um exemplo de como o agronegócio pode ter uma responsabilidade socioambiental maior

Segundo os estudos do projeto Terraclass, que mapeou o que houve com as áreas desmatadas no Brasil desde os anos 80, sabemos que 63% delas são áreas ocupadas por pecuária de baixa produtividade, mantendo menos de 1 boi por hectare, e que 23% dessas áreas estão abandonadas e em processo de regeneração florestal. Mesmo assim, entre 1991 e 2017, a produção de grãos no Brasil cresceu 312%, e a área plantada cresceu 61% no mesmo período.

Grupo de gado branco em uma fazenda, com um boi sentado no primeiro plano, cercado por outros animais de pé.

A pecuária de baixa produtividade (menos de 1 boi por hectare) ocupa 63% das áreas desmatadas no Brasil. Será que não podemos aproveitar melhor nossas terras? Foto/Reprodução: Pixabay/Frank B Araujo F

Esses exemplos mostram que podemos crescer economicamente sem a destruição de nossas florestas, e que é essencial fazer um melhor aproveitamento das áreas já desmatadas, criar esforços para a criação de sistemas de agrofloresta que possibilitem uma maior variedade de alimentos produzidos para diversificar um pouco o cenário de monocultura predominante no Brasil, usar de forma sustentável os produtos das florestas, defender as áreas protegidas e recuperar as áreas degradadas. Esse é o caminho para aliarmos produção e conservação em um país que tem potencial, espaço e criatividade para fazer isso e muito mais.

Para saber mais detalhes sobre Unidades de Conservação, acesse os seguintes links:

Árvore, Ser Tecnológico:

https://www.facebook.com/arvoresertecnologico/

Fatos Florestais
https://bit.ly/2YjiLS3

O que são Unidades de Conservação?

https://bit.ly/2M88vZZ

MMA –  Unidades de Conservação Terrestres

https://bit.ly/2ZyQEhY

MMA –  Áreas Protegidas

https://bit.ly/2x9iYLz

Sobre o Parque das Aves

O Parque das Aves, um centro de resgate, abrigo e conservação de aves da Mata Atlântica e o atrativo mais visitado de Foz do Iguaçu depois das Cataratas, completa 30 anos de atuação em 2024. Como é uma instituição privada, os visitantes promovem a continuidade do trabalho do atrativo através da visita ao Parque, consumo nos restaurantes do Complexo Gastronômico e compras na Loja de souvenirs.

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